Como se faz o poema de Lucas Litrento
Lucas Litrento é escritor, realizador cinematográfico e produtor cultural. De Maceió (AL), publicou os livros Os meninos iam pretos porque iam (Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2019) e TXOW (Edipucrs, 2020), além do zine de poesia ROBYN (1TXW, 2020). Realizou o curta-metragem círculos (2020) e assina roteiro e direção, com Janderson Felipe, do curta-metragem Samuel foi trabalhar (em produção).
Como se faz o poema?
É a penúltima cena de “Eles não usam black-tie”: Fernanda Montenegro catando feijão, entre prantos. É um beat do J Dilla. Se faz assim, percebendo essas coisas, não tem segredo.
Você tem algum ritual de preparação para a escrita? Como é esse processo?
O pré-ritual é a leitura. O pré-ritual é ser uma esponja do que eu sei que vai servir, tem uma malícia. Depois, o ritual (que não é regra, muito menos ritual) é ficar atento às coisas, tão atento ao ponto de surgir uma obsessão por algo inútil. Um som, a vontade de copiar outro artista, de dar uma reposta que esse artista nunca vai ver. De continuar o telefone sem fio. Samplear. Mas também pode ser burocrático, pela necessidade de fechar uma encomenda, de completar x caracteres, etc. Por mais difícil que seja, há diversão na escrita de um poema. É quando a DJ, muito preocupada, já na sexta latinha, acerta a virada. Tem uma tensão ali, porque no poema tem muita nebulosidade, mas é divertido. Então esse processo vai por muitos caminhos e apesar de ser divertido, por ser essa montanha russa, é estressante. Longe de mim romantizar a escrita de um poema. É muito mais difícil que escrever prosa. Mexer com bicho vivente, toda hora se mexe. Não se espera que um poema para de se mexer pra começar a podá-lo, ele não vai parar. O jeito é pegar o ritmo desse mexe-mexe.
Você revisa seus poemas?
Sou capricorniano.
Nada fica pronto na primeira escrita (exceto mensagens do WhatsApp, algumas). A reescrita é a parada, mexer nas peças de Lego. Porque surgem variações do poema que ficam brigando pra continuar ali. A revisão sempre expande todas as possibilidades dos textos. Com os poemas é melhor ainda porque essa atenção redobrada no ritmo, na música, dá muito mais trabalho.
A primeira escrita é muito menos que um rascunho, é uma espécie de sussurro da ideia. O poema é feito nas reescritas.
De onde surgem as ideias para escrevê-los?
De dentro, tudo sou eu; depois eu percebo.
É como um raio-x, no fim das contas, porque diz muito sobre como tô me sentindo. Se é sentimento mesmo não sei como surge, só surge. Mas tem os controles, de novo as burocracias. Gosto muito de um tema rondando um livro de poemas, não gosto da ideia de coletânea. Então muitas vezes há um estudo dos temas que tô trabalhando, há um momento de forçar a memória, de buscar imagens daquele tema, de buscar em imagens. E por aí vai.
Qual é o seu poema favorito? (Seu e de outro poeta)
Não sei, agora é Riobaldo rimando; ando lendo. O meu... “curva da bala” dos Meninos, tem uma parada ali.