Fósforo chega ao mercado e traz livro inédito de Astolfo Marques
Pela primeira vez reunidos em um livro, os contos de Astolfo Marques (1876-1918) enriquecem nosso entendimento da Abolição da escravidão e abrem caminho para uma nova compreensão do 13 de Maio no Brasil.
Entre os primeiros lançamentos da editora Fósforo, está o inédito livro O Treze de Maio: e outras estórias do pós-Abolição, de Astolfo Marques, organizado por Matheus Gato. Astolfo Marques fez literatura a partir da matéria viva de uma República jovem e da derrocada dos sonhos pós-Abolição ao escrever na virada do século 19 para o 20, na periferia do Brasil. Uma literatura daqueles que ansiavam pela liberdade e encontraram um Brasil desigual e hierárquico. Homem negro e livre de um tempo em que libertos e escravizados conviviam em todo o país, Astolfo escreveu histórias capazes de flagrar o momento e seu caráter cambiante sem poupar contradições e complexidades.
O Treze de Maio reúne uma seleção de 17 narrativas breves concentrada no retrato das reverberações do fim da escravatura em uma região especialmente vitimada pela brutalidade, como foi o Maranhão. Publicada na tinta fresca da imprensa nacional, a ficção de Astolfo chegou a ser entendida pela crítica de seus dias como um mero espelho irrefletido dos tempos. E, não à toa, por pouco não foi completamente apagada, permanecendo restrita aos arquivos históricos da imprensa maranhense até que o sociólogo e pesquisador Matheus Gato resgatasse e reunisse pela primeira vez os contos desse grande escritor brasileiro, cujo humor e sagacidade machadianos já deveriam há tempos integrar nosso repertório literário, ou como diz o escritor Paulo Lins, que assina o prefácio dessa edição, um autor que "deve figurar como um clássico".
Os personagens de Astolfo empregam a língua falada, a língua viva, maranhense e brasileira. Mostram-nos, em suas andanças narrativas, um escritor interessado nas “alegrias, frustrações e desafios da vida cotidiana da gente negra e pobre”, mulheres que fazem da praça pública sua casa e domínio, operários nordestinos e militantes abolicionistas que desejam, mais que tudo, a quebra de estruturas, “pessoas para quem a cidadania também se exerce na festa”, como escreve Matheus Gato, “quando a música e a noite tomam o lugar das rotinas do trabalho diário, nos chinfrins e pagodes dos arrabaldes, mas também naqueles momentos de devoção e de fé”.
Em seu retrato pulsante da vida anônima, Astolfo Marques denuncia um Brasil que flerta, em discurso e ação, com uma república urbana e importada, mas que abriga em sua cartografia humana as marcas e as consequências de um passado que ainda se faz presente.
Sobre o autor:
Raul Astolfo Marques nasceu em São Luís do Maranhão em 1876 e morreu em 1918 na mesma cidade. Escritor, jornalista e tradutor, publicou contos e crônicas nos principais periódicos maranhenses à época e os livros A vida maranhense (1905), De São Luís a Teresina (1906), Natal (quadros) (1908) e A nova aurora (1913). Autodidata, trabalhou como contínuo na Biblioteca Pública do Maranhão, foi um dos fundadores do grupo de intelectuais Oficina dos Novos, que deu origem à Academia Maranhense de Letras, da qual foi membro.
Sobre o organizador:
Matheus Gato nasceu em Campinas, São Paulo, em 1983, e viveu até a juventude em São Luís do Maranhão. Em 2002, ingressou na Universidade Federal do Maranhão onde se dedicou à mobilização estudantil por ações afirmativas e políticas de cotas. Com doutorado e pós-doutorado pela Universidade de São Paulo, foi visiting fellow no Hutchins Center for African and African American Studies da Universidade Harvard em 2017 e 2018. É professor do Departamento de Sociologia da Unicamp, pesquisador do Núcleo Afro\Cebrap e coordenador do BITITA: Núcleo de Estudos Carolina de Jesus (IFCH-Unicamp). É autor do livro O Massacre de Libertos: sobre raça e república no Brasil (Perspectiva).