O buquê
Era sempre aquele nó na garganta. A vontade prematura de dizer que a amava, mesmo com a então namorada. Ela resistia aos seus ataques de sedução, dizendo, escandalizada: “Você tem namorada!”, e ele se amuava.
Mas a namorada passou, ficantes passaram de lado a lado e de repente eram só os dois. Ou três, porque sempre que saíam para beber, a amiga deprimida e dependente ia junto, e até hoje ele não sabe por quê aquela proximidade, aquela seguradora de vela junto, sempre aquele nó na garganta, a vontade de dizer que a amava, mas não à vista de terceiros.
Tomavam grandes porres e iam dormir os dois, sempre juntos, quase sempre no apartamento dele. Antes de dormir, uma boa trepada, quase sempre também. Mas o nó na garganta nunca se desfazia, pois se ela o amava, faltava-lhe o toque heroico da paixão. Ele se perscrutava sobre a sua paixão, mas tampouco tinha uma resposta para isso.
E eram manhãs, tardes e fins de tardes a partilhar. E as noites, interrompidas apenas pelas quatro horas de aula na faculdade. Ela estava um ano à frente dele.
Depois de uma noite de aulas, certa noite de junho, foram para uma festa típica da época. Tinha mais gente no carro, um amigo de Garça, a tal amiga colante. No caminho, um canteiro central com a irrigação ligada, do tipo que girava. Ele, num surto de liberdade, largou o carro de qualquer jeito e saiu, sobretudo de lã grossa preto, para ser molhado por aquela água e também pelo sereno. Ele erguia os braços, e rodava, e a namorada foi atacada do mesmo súbito ataque de euforia, e se juntou a ele, e se beijaram, em ondas frenéticas que lembravam as ondas do mar que ele lhe apresentara. Quando chegaram à festa, ele pulou fogueira e ela apenas se chegou junto a ela.
Mas era a história de um amor impossível, porque infantil; os dois se amavam, mas como duas crianças se amam, mesmo com o presente do mar profundo, de todo o Oceano Atlântico na vida deles. Ele a amava mais, parecia. E por isso sempre o nó na garganta. Até que se largaram, voltaram, e se largaram de novo e para sempre. Então ele deixou a faculdade, os amigos e aquela ex-namorada com quem foi dividir a casa na condição de amigo, penosa demais para ele. Foi para Londres, ultrapassando aquele Atlântico, passou uma temporada, e ao retomar os estudos, foi em uma universidade longe de Bauru. Resta dizer que o nó na garganta era num homem bonito, olhos rasgados de origem asiática, bronzeado e cabeludo – ela gostava de cabelos compridos, embora os seus próprios não passassem dos ombros. Mas homens de cabelo comprido, isso sim. Mas no devido momento, cortou os laços e os cabelos. Porém, persistiu o zelo em saberem um do outro, de se animarem, de se encorajarem. Em todo o caso, era tudo o que podiam fazer ao longo dos anos que se seguiram. E continuaram conhecendo pouco um do outro, como alguém que ganha um buquê de flores variadas às quais não se pode denominar nem captar a sutileza de apenas uma pétala. Eles eram, um para o outro, a verdura fresca daquelas flores, e o espanto de que elas fossem tão bonitas.