Entrevista com Jana Lauxen | Ed. Os dez melhores
Uma das propostas da Os Dez Melhores é de ficar próximo ao autor e fazer com que seu livro seja vendido e lido principalmente. Mas como vocês veem a atuação dos autores nesse processo?
A presença, o envolvimento e a dedicação do autor são absolutamente necessários. Sem ele, se torna impossível divulgar e vender seu livro. Em nosso caso, especificamente, consideramos fundamental que o autor esteja disposto não só a divulgar sua obra na internet, mas a sair a campo, levar seu livro até o leitor – seja em escolas, feiras, saraus, onde for possível.
No entanto, um problema bastante comum que enfrentamos é o fato de muitos autores acreditarem que seu trabalho termina quando enviam seu livro para uma editora. Autor e editora precisam ser parceiros – não se trata de uma relação hierárquica, onde um manda no outro. Se não for assim, nosso método de trabalho não tem como funcionar.
Dá pra ver que cada livro publicado por vocês recebe a atenção que todo livro deveria ter para divulgação. Manter esse ritmo ajuda a editora a distribuir melhor os livros?
Sim, colabora bastante. No entanto, a internet nos ajuda mais no sentido de tornar nosso trabalho conhecido, de promover nossos projetos entre pessoas que não os conheceriam, não fossem as redes sociais.
Mas nossa divulgação virtual não gera vendas relevantes de livros. Para ser franca, pouco vendemos através de nossa livraria virtual. Nossa distribuição é focada basicamente em projetos locais, como feiras, saraus, lançamentos e eventos literários em escolas. Em nosso caso, é no corpo a corpo que a distribuição e a venda acontecem.
Os livros de vocês são vendidos em livrarias? Qual a relação que vocês possuem com elas?
Não, somente em nossa livraria virtual.
No caso da Editora Os Dez Melhores, nossa relação com livrarias é praticamente nenhuma. É realmente muito difícil estabelecer parceria com livrarias, justamente por que elas abocanham 40% ou 50% do preço de capa da obra, e ainda deixam com a editora os encargos com frete e etc. O lucro se transforma em nada.
Se uma editora grande imprimir 5.000 exemplares de um livro, este livro terá um custo por exemplar muito inferior ao custo por exemplar de uma tiragem de 200 exemplares, por exemplo. E editoras médias e pequenas trabalham com tiragens médias e pequenas. Em nosso caso, a maior tiragem que já fizemos até hoje foram 500 livros.
Logo, uma editora grande pode fechar parceria com uma livraria e, mesmo pagando frete e 50% sobre a capa, ainda lucrar. Editoras pequenas, não.
Ademais, editoras pequenas geralmente publicam autores ainda desconhecidos do grande público. O que também dificulta a venda efetiva em livrarias. Afinal, ter seu livro ao lado do best-seller não significa, de maneira nenhuma, que ele irá vender como o best-seller.
08guns dos livros publicados pela editora são resultados de trabalhos em coletivo com vários autores, quase sempre de jovens escritores que ainda estão na escola. Você acredita, Jana, que esse tipo de trabalho contribui com a maneira como os jovens notam a importância da leitura em suas vidas?
Com certeza.
Eu realizo uma palestra em escolas chamada A Literatura Não é Chata, onde listo oito motivos práticos que comprovam a importância da leitura para nossas vidas, pessoal e profissionalmente. Eu tento provar para a gurizada como é importante ler. Mas, antes de iniciar a palestra, eu sempre pergunto quem na plateia gosta de ler. E são sempre meia dúzia que levantam a mão.
Isso é grave, é triste, é preocupante, é desesperador! Porque a leitura é um dos meios mais eficientes para aprendermos a pensar com a nossa própria cabeça. Para não sermos alienados, facilmente ludibriados.
Recentemente saiu uma pesquisa do Instituto Paulo Montenegro (IPM) e da ONG Ação Educativa, intitulada “Analfabetismo no Mundo do Trabalho”, que diz que somente 8% dos brasileiros são capazes de compreender e se expressar de forma lógica e correta. Somente 8% são capazes de pensar sozinhos.
E isso é reflexo de um país sem leitores.
A leitura gera independência intelectual e, na minha visão, somente através da independência intelectual poderemos realmente almejar um futuro melhor e mais decente para todos nós.
O mercado editorial vem tendo uma recepção bastante forte das pequenas editoras. Mais pessoas estão querendo publicar livros ou a criação de mais e mais editoras é algo inevitável devido às dimensões do nosso país?
As duas coisas, eu acho.
Há 15 anos, para publicar um livro, ou você tinha dinheiro, ou você tinha padrinho. Não existiam tantas editoras pequenas, o que impedia que a maioria sequer sonhasse em publicar um livro.
Com as novas tecnologias, publicar tornou-se acessível para todos. O que é bom, já que vivemos em uma democracia; mas, ao mesmo tempo, prejudicou muito a qualidade dos livros publicados – seja esta qualidade gráfica, editorial e/ou literária. As deficiências que percebemos em nosso mercado editorial são um efeito colateral deste processo de democratização literária.
De qualquer maneira, prefiro todo mundo publicando, do que ninguém podendo publicar. Eu me beneficiei totalmente desta democratização, e acredito que, com o passar dos anos, o mercado editorial tende naturalmente à profissionalização e à qualificação. Já vemos isso acontecendo.
A editora tem participado de feiras literárias? Acha que são importantes para a divulgação dos livros e dos autores ou entende que muitos eventos literários, como algumas Bienais pelo país estão apenas se transformando em um gigante local de comércio de livros, onde o capital acaba sendo mais importante que a literatura em si?
Eu creio que o primeiro passo é entender que tipo de autor ou que tipo de editora você é. Se você é o Paulo Coelho ou a Fernanda Torres, ou se sua editora é a Record ou a Cia. das Letras, acho válido participar de Bienais mundo afora.
Mas, se você é um autor independente que publicou por uma editora pequena uma tiragem de 100 exemplares, não faça isso! Eu vejo muitos jovens autores e editoras miúdas vendendo os rins para participar de eventos como a Bienal Internacional do Livro de São Paulo. Aí chegam lá, ficam o autor e o editor na banquinha, solitários, enquanto ao lado cem mil pessoas se estapeiam para pegar um autógrafo do autor bombado do momento. É triste.
Por isso vemos tantos autores e editores frustrados e ranzinzas: porque eles querem fazer parte de algo grande, sendo pequenos. Porque não entendem qual é o seu tamanho, o seu papel, e nem qual é o seu público.
Se nós, da Editora Os Dez Melhores, quisermos competir com a Editora Globo, o que vai acontecer? Seremos miseravelmente esmagados. Mas nós entendemos quem somos na fila do pão.
E justamente por isso participamos, sim, de feiras e eventos literários. Mas não da Bienal. Aqui mesmo, em nossa cidade, Carazinho/RS, que tem 60 mil habitantes; estamos sempre envolvidos em feiras de rua, lançamentos e atividades em escolas. Agora em junho, por exemplo, acontece a 3ª edição da Mostra de Arte do Saloon, evento organizado por nós em parceria com o Rancho Cavalo de Troia e a Revista Café Espacial. São mais de 20 artistas envolvidos, e é extremamente gratificante fazer parte deste projeto. Divulgamos nosso trabalho em parceria com outros artistas, vendemos livros, fazemos contatos. Impossível ser melhor.
Nunca saímos de uma Mostra de Arte decepcionados, como eu tenho certeza que muitos autores e editores já saíram de bienais.
Qual a tiragem mínima que vocês estão fazendo para um livro? Como se dá o processo de publicação com vocês?
No caso de nosso selo social, o Nascedouro, a tiragem mínima são 150 livros, visto que, menos do que isso, o custo por exemplar fica muito alto, inviabilizando a publicação. No caso de autores solo, a tiragem fica entre 300 e 500 exemplares.
No entanto, em 2015, passamos por um processo de reformulação de nossa proposta editorial. Eu e meu sócio sempre tivemos em mente que, se fosse para abrir uma editora, precisávamos ter uma proposta diferente, e não mais do mesmo. Se fosse para fazer o que a maioria já fazia, era melhor continuar com a maioria, e não se lançar sozinhos nessa jornada – que não é fácil, que não é simples, e que não é barata.
E justamente por mantermos este pensamento que, no final de 2014, estávamos nos sentindo insatisfeitos com o rumo de nosso trabalho. Assim, buscamos nos focar mais em ações locais e regionais, pois deste modo conseguíamos manter um certo controle sobre as nossas atividades, e realizar nossos projetos com maior eficiência. Colocamos a editora para trabalhar para nós, e não mais o contrário.
No momento, não estamos recebendo originais para avaliação. Acabamos de lançar o romance planetário O Duplo da Terra, que é meu terceiro livro, e oitavo da editora. E agora vamos trabalhar para vender e divulgar este livro. O próximo lançamento deve acontecer somente em 2017.
Então, nosso processo de publicação é este: publicar menos, bem menos, e focar nossa energia e trabalho no sentido de divulgar e vender estes poucos livros publicados.
Menos quantidade para ter mais qualidade.
O que fez a Jana Lauxen se tornar uma editora?
Foi algo que simplesmente aconteceu. Nunca havia pensado em me tornar editora; eu queria ser escritora. Porém, o mercado independente exige que você faça mais, do que apenas aquilo que você acredita que deve fazer.
Comecei em 2008 organizando coletâneas pela editora carioca Multifoco. Depois passei a editar a versão brasileira do site inglês 3AM:Magazine. Nesta época, meu lema era: se me convidarem, eu aceito. Queria trabalhar com literatura, não importava de que lado do palco.
Depois, editei o site cultural E-Blogue.com, e então fui efetivamente trabalhar como editora para a Multifoco. De lá para Os Dez Melhores foi um caminho natural.
E apesar de me considerar, primeiramente, uma escritora, fico muito feliz de trabalhar como editora também. Acho fundamental o escritor conhecer o mercado do qual faz parte e no qual interage, e entender os passos do processo de publicação de seu livro. É importante ver o todo.
Percebo que muitos autores, inclusive alguns bastante renomados, possuem um parco conhecimento do processo editorial, e isso é bem perigoso.
O que mudou na sua vida enquanto uma pessoa responsável por inserir na sociedade novos livros, novos conteúdos que podem contribuir diretamente na formação da sociedade?
Eu sinto que faço tudo o que posso fazer, e essa sensação me deixa feliz.
Sempre pensei que eu gostaria de realizar um trabalho que fizesse sentido para mim, e a literatura me deu isso.
Hoje, além de escrever, eu também tenho a oportunidade de realizar este trabalho em campo, na festa, na praça, na escola, diretamente com o leitor, o que é muito, muito gratificante. Um combustível e tanto para seguir trabalhando com literatura em um país que não lê.