A poesia de Geraldo Lavigne
Geraldo Lavigne de Lemos é membro da Academia de Letras de Ilhéus, autor dos livros À Espera do Verão (2011), amenidades (2014) e alguma sinceridade (2014), todos de poesia e pela Editora Mondrongo.
cachoeira
louvo o curso deste rio
pela mensagem silente
de amar o inimigo
espumo palavras
entre meus dentes
: leito calado
e impotente
espero um dia
poder vomitar enchentes
como fez o rio em 67
*
um céu todo branco
um céu de nuvem
o sol por trás
a nuvem arde
a chuva cai
cai a chuva
como a luz que sai
chove luz e água
apenas vejo os pingos
diante dos meus olhos
– a claridade esconde os demais
*
pertencimento
o meu umbigo
foi enterrado
nas terras pretas do curral
no meio do mijo
e do esterco
os meus pés virgens
foram postos
nos atoleiros dos encharcados
as minhas mãos
foram dadas
ainda cedo
às coisas do campo
os meus braços
conheceram a tiririca
e as minhas pernas, o cansanção
contra minha pele
investiram muriçocas,
abelhas e marimbondos
fui içado
sobre o lombo do cavalo
e dele caí como aprendiz
de tudo guardo
a querida infância
quando chego aos caminhos
que conduzem a este solo
retorno para o meu peito
e habito o meu coração
não há lugar no mundo
que substitua
a lama
que consumiu o meu umbigo