24 de junho de 2015

Dois passarinhos

Dois_passarinhos_CAPA_BAIXADificilmente os pais leem histórias para os seus filhos. Os que ainda conseguem fazer isso, nos dias correntes, são tidos como heróis, pois conseguem dividir muito bem suas tarefas cotidianas e parar um pouco para aproveitar a leitura de um livro com seus filhos.

Tendo em vista que, geralmente, são histórias que acabam fascinando a criança com os mundos fantasiosos, parece que Dipacho, ou melhor, Diego Sánchez, prefere contar um mundo ao qual não é tão bem quisto assim, o da natureza. Além disso, a história de seu livro, Dois passarinhos, parece querer trazer a criança para um outro nível, o do exercício da reflexão.

Nas páginas do livro o que se observar é um tronco negro, ao fundo, que divide a página e dois pássaros que moram a árvore que possui um largo tronco, mas braços estreitos. Os passarinhos residem separados pelo tronco. Um é branco, ficando à direita da árvore, e o outro é negro, residindo à esquerda dela. Aparentemente, os dois estão tranquilos, observando o horizonte, até que, de repente, um sai voando e acaba por aguçar a curiosidade do outro.

O que será que vai acontecer?

Objetos, dos mais variados tipos, de uma luminária até uma estante de livros, começam, então, a serem trazidos, pouco a pouco, para os galhos da árvore, que, consequentemente, começa a ter os seus ‘braços’ envergados.

Em poucos instantes, o cenário já está totalmente tomado por uma bicicleta, um violão, uma televisão, um vaso sanitário, um toca discos, um telefone e muitas outras coisas que não fazem muito sentido entre si. O interessante é que até aí tudo parece estar muito tranquilo. Os passarinhos usufruem de todas as coisas que trazem, mas fica nítido que só podem aproveitar uma coisa por vez, então por qual motivo trazem tantos objetos para sua moradia que poderá correr o risco de vir abaixo?

Dois_passarinhos_duplas13

A resposta que nos vem à mente é a de que existe aí uma crítica ao consumismo desenfreado, já que fica perceptível a simples mania dos passarinhos estarem trazendo inúmeras bugigangas que logo não lhe servirão de nada.

Contudo, fico questionando se também não podemos ser mais simples e apenas dizer que o que eles estão fazendo é juntar tralhas num local onde não é possível juntar tralhas. Talvez a leitura feita pela criança seja totalmente adversa do que pensamos, afinal o livro é infantil. Prefiro ver com os olhos de que a história mostra que devemos ter conosco apenas o essencial. No caso dos passarinhos, a natureza já devia-lhes bastar, não tendo eles motivos para adquirirem dois carros enormes, um violoncelo, um tambor, uma lixeira, etc. para sobrepor aos galhos da árvore.

Além disso, o que me chamou a atenção é como Dipacho faz isso na história, porque por mais que eu queira acreditar na minha segunda interpretação, mais do que isso é notar como ele faz a história dos dois passarinhos ter diversas interpretações e que, facilmente, pode ser utilizada com crianças de idades totalmente distintas, até mesmo com crianças de 50 anos. E isso é fantástico, pois ele faz tudo isso sem emitir uma única sequer palavra em toda a obra. Às vezes, parece, as imagens falam mais que as palavras.