Violeta velha e outras flores
Não é exagero afirmar que Matheus Arcaro publicou, com seu primeiro livro, uma antologia. Isso fica claro por dois fatores distintos: a irregularidade dos contos e a variedade de temas, o que torna o livro plural.
Violeta velha e outras flores (Editora Patuá, 170 páginas) traz 22 contos curtos, dividos em seis partes. Desde sua epígrafe, e para o leitor atento, já desde o próprio título, fica clara a preocupação do autor em fazer de sua arte um fenômeno estético. Mas como todo bom escritor, Arcaro pretende ir além: ele quer estremecer as verdades do leitor, fazê-lo refletir, buscar novos caminhos ou, até mesmo, (e por que não?) corroborar os valores que já possui, se compartilhados com os do narrador/autor.
Matheus Arcaro trata de temas sempre atuais, como o uso de drogas (Alice), a morte em vida (Festa), a visão de que os lares para idosos no Brasil são, na verdade, depósito de velhos (Visita), a iminência da morte e as relações familiares (A cura) e até flerta com o realismo fantástico (Está tudo escrito).
Toda a obra é permeada de um lirismo por vezes tocante, outras vezes intrigante e ainda, algumas vezes, engraçado, beirando o deslocado. Mas não há peças completamente fora de lugar no jogo de Arcaro. É nítido que o autor mune-se de todo o seu arcabouço literário para construir suas histórias, que desenvolve, a um só tempo, com firmeza e delicadeza. Seu fazer-pensar, sua escrita filosófica, que comporta de Kant a Nietzsche, numa polifonia que mistura discursos, resultando em sua própria voz. De dentro dele ecoam Rosa, Clarice, Faulkner e tantas outras vozes. Mas é primordialmente isso que interessa aqui: Matheus Arcaro é dono de uma voz própria.
Fica a sensação de que o livro foi maturado por muito tempo, pensado, gestado. Se há o sentimento de irregularidade, não é senão pela abrangência de temas e pelas particularidades das nuances narrativas – algo de que só é capaz aquele que entende o que almeja quando resolve unir palavras para contar uma história. Afinal, selecionar aquilo sobre o que se deseja escrever é possível? Para Arcaro, cujo sobrenome por si só já permite uma brincadeira com palavras, com certeza sim. Numa junção entre o etéreo e o onírico, ele nos leva por caminhos, se não completamente novos, seguramente únicos pelo seu modo de nos fazer enxergá-los.
Eis aqui alguém que ainda se refinará mais e mais ao longo do tempo, mas que não se pode, nem se deve, ignorar.