24 de março de 2015

A poesia de Jádison Coelho

PERMITA-ME O INCESTO

(Jádison Coelho)

 

Estou a falar de amor, e

não estranhe tal estranheza a minha.

Se não estranho a tal estranheza sua, por hora.

Se num dia estou a falar de amor

é por que vai ele muito mal.

 

Estou a falar de amor como um colar de pedras

desfeito num sopro quente, dissolvendo

a linha que sustenta pedras em si.

 

Meu amor não entra pelas portas do fundo,

mas pelas beiradas do telhado rachado,

num ping

pong das gotas da chuva reunida

num balde razo,

pra não molhar toda

a casa e não nos inun........dar

de tamanha estranheza.

 

E depois te pergunto eu, com tamanha firmeza:

De que nos adiantará se ainda não se fez tempo?

 

Eis aqui a triste certeza

dos lamentos árcades da vida que não permitiu

que fossemos aqui como colar de pedras,

só apenas pedras

espalhadas por dissolvida linha de sustento

em nossos colos.

 

Estou a falar de amor pelas notas de um rock sonolento.

Ser o abandono dos abandonados

é o meu triunfo mal acreditado de

um dia meu amor ainda ir bem,

e não tão mal como ness'hora,

que dispenso eu da danação e penso

não amar nunca mais!

 

E mais do que nunca,

estou a falar de amor, Anjos,

Anjos do mal.

Anjos do bem que me perdoe

o impiedoso rancar das cutículas

na cantiga de ninar que tirou o sono.

Destrona do destrono e venha pelo amor,

maldizer-me!

 

Ingratidão a sua, viu, o Amor. Ingratidão!

Logo eu, que sempre te fiz o favor de deixar-te em paz.

 

Veja só o castelo de baralhos que montei,

está desfeito por um relapso

da atenção nas vértices do mal.

Ainda sim, indedetizável nas pregas dum amor,

estou eu mal servido, Anjos de mal.

 

Anjos, não vê?

Não quero ser seu amigo,

Anjos, nem teu filho quero ser, ó mô pai.

O senhor é muito mais para ser apenas amor!

Olhe-me melhor no íntimo dos versos.

Permita-me tal incesto

se estou eu a falar da gente.

 

***

 

VERSOLHÁVEL

(Jádison Coelho)

 

Gosto

de quando

em vez de quando em quando

me perco da haste

enquanto

a figura transborda

a figura

por ela própria

pelas bordas miúdas

da loucura

e só há

o diabo para dizer

Amém

Amém disse

fulano ao cicrano

que, exclamou e indagou deltrano

como quem despenca de um pilar:

Cheiras bem! É o quilo isso

que dejetavas?

-Falacias

e só.

 

***

 

PARADOXÍLABO

(Jádison Coelho)

 

Me responda:

Qual poeta?

Um me arrepia a espinha e,

outro me enoja em todo o resto.

 

Eis que já dito, reponderei o óbvio:

São três!

Há um alguém em mim que geme as dores

Há outro alguém que ameniza os prantos

Há uma capa que junta ambos,

cintila o nascimento fazendo nascer

alegria.

 

E enquanto você é dois lados iguais

duma mesma moeda,

eu sou a dor do parto

anunciando o que tenho de melhor

em versos.

 

***

 

POETA DAS LUZES

(Jádison Coelho)

 

Olha aqui, poeta das Luzes,

por vezes te deixei vir e ocupar o meu lugar,

mas nestes versos de acá, quem canta é aquele

que não tem coroa

anda na proa duma nuvem

soltando gritos na tempestade.

 

Olha aqui, poeta das luzes,

moralista de mal resolvido,

a época do meu gemido é te suicidar

e manter-me sol apagado,

queimando...

 

Me deixe aqui pra ser levado por um raio.

E te partas enquanto há tempo,

poeta das luzes.

Me deixe só, e só não me controles,

pois como já dizias tu ao próprio descuido:

Aquilo lá só não come pedras, senhores,

que é pra não cagar entulhos.

 

***

 

FAÇO-TE GOZAR!

(Jádison Coelho)

 

Te faço rir.

Tua boca macia em meus

pensamentos ovais assim diz

pra mim:

-Você me faz rir.

 

E em cada riso teu estão os meus braços

sobre os teus,

as minhas pernas estão

sobe as tuas,

e Teu é o meu fôlego sobre tu mesma.

 

Assim te faço rir.

Assim você me faz vibrar líquidos escorregadios,

assim te faço eu

feliz e sorridente com gemidinhos abafados.

 

Por fim somos felizes.

Ora pois, se te faço ri,

por ora mérito, por ora prazer,

Faço-te gozar!

 

*Jádison Coelho, nasceu em Salvador-BA, no dia 25 de Julho de 1992, é natural da Atlântida Negra e do planeta Marte, poeta visceral, graduando no curso de Letras Vernáculas pela Universidade Federal da Bahia, pesquisador nas áreas de Literatura e Cultura, uma voz em vozes mescladas às identidades múltiplas, que constituem um espelho quebrado em estilhaços despidos de poesia escancarada na garganta virada. Viajante, diasporizante em ousadia, por ser um exilado da República, Coelho pega picula com os mais velhos e ultrapassa as fronteiras terrioriais. O poeta dobrado em múltiplos, participou do projeto “Bate Papo Musical” (A Produtora- Salvador-BA) , da antologia e prêmio “100 poemas 100 poetas” (LiteraCidade- Belém-PA), de boa fé integra a comunidade de Luso-Poetas. Por gosto dum gostar de em público maldizer de si e dos outros, publica alguns poemas nas redes sociais. Jádison Coelho participou da Antologia "Cidade10" (LiteraCidade- Belém-PA) com sete poemas que revelam de qual cloaca saíra para o mundo beijar. Cria de Anjos, Gregórios, Baudelaires e Bocages, lambedor da face roseana, o poeta baiano não é ninguém, é ele mesmo debruçado em leituras ao passo que ninguém lhe satisfaz o desejo de ser alguém pintado às irís saltitantes do leitor. Mas se não o quiser lê-lo, faz muito bem! Coelho é um fingidor, dissimulado, tem a língua escorregadia em forma de tapete. Ele finge tanto, mas tanto, que, finge fingir e mente de forma desmemorada. Esse poeta não é nada, meu senhor. E se um dia ele foi alguém, esse alguém não existiu, pois o existir é a capacidade respiratória dos não vermes. Releve a sua verve, quem feito hiena ataca, é por quê pode ser Ninguém.