2 poemas de Matheus José Mineiro
a silaba tônica da palavra rotina
é estilete que raspa qualquer língua.
quando delicadamente no seu estiletar
arranca uma pelanca do peito
e abre um fiorde que se estende até o crânio,
saco do mamanguá
delicadamente aberto neste estiletar.
de-li-ca-da-mente
qual estilete
este
que massageia a palavra cidade e
navalha tudo que nossas ânsias contêm de casca,
de polpa e de pele.
qual estilete
este
da sílaba tônica da palavra rotina
que perfura a rubra barriga da tarde
e vazam estrelas e estrelas e mais estrelas
no preto pontilhado do piso do céu
e cada cidadão em sua orbita
vira de costas para o sol e se anoitece.
mesmo à meia-noite pessoas agem
como um sol de meio dia que arde.
besunta os cacos de vidro
com a saliva
quando soletra a palavra descanso.
rasga a letra M do mundo
e espirra uma menstruação nuclear, carmesim entornado
na cor ciano que te tinge todas as manhãs.
os dias passam puindo
incisão sem sedativo
no organismo sub verso vivo.
Gente é poema e poema é gente
a gente lendo o poema é
bezerro sendo apresentado a chifrada e a testada.
o poema lendo a gente é
potro sendo apresentado ao coice.
a gente lendo o poema é
pintainho sendo apresentado ao esporão e a aurora.
o poema lendo a gente é
brisa sendo apresentada ao ciclone.
a gente lendo o poema é
embrião sendo apresentado ao homem.
o poema lendo a gente é
canivete sendo apresentado a jugular.
a gente lendo o poema é
beiço sendo apresentado ao beijo.
o poema lendo a gente é
rave dentro de uma cápsula.
a gente lendo o poema é
usina nuclear dentro de uma borboleta.
o poema lendo a gente é
euforia carnavalesca numa migalha de pão.
a gente lendo o poema é
extravasação vulcânica dentro de um cisco.
o poema lendo a gente é
alcalóide sendo apresentado aos neurônios.
a gente lendo o poema é
gorjeio sendo apresentado a goela.
o poema lendo a gente é
abraço sendo apresentado a costela.