Aguenta um não?
Eu bem que avisei, mas ele levou na brincadeira. Eu disse que não passava a mão, que a sinceridade era o que trazia comigo há tempos. Li, não gostei e disse. Não foi assim, de supetão, foi com calma, sereno, sem estardalhaço, porque um não é algo ruim de ouvir, mas ele se emburrou, ficou sem falar uns dias, já teve até quem não falasse comigo durante meses, até que depois, meio que sem jeito, vinha novamente pedir para ler outro texto. Sempre estou de braços abertos, mente fresca, porém quando me tratam mal dá desgosto de ler outro texto, novas frases.
Quem edita sabe que dar “não” não é fácil, mas também ser recebido com pontapés quando isso acontece não é nada agradável. E ainda há quem saia por aí dizendo que não entendemos nada, que somos uns pedantes e que nos achamos os maiores críticos da casa da mãe Joana. Bem, eu só tenho pena da Joana, porque deve receber muita gente por lá e uma hora ou outra talvez lá não tenha mais espaço para novos críticos renegados.
A gente, que é metido a editor, como os que recebem os não nos chamam, tenta apenas ser honesto com o nosso gosto, no final das contas, mas também há de se entender que a gente lê muito e que pra nos agradar fica até difícil se a escrita não tiver “jeito”. A gente tenta dizer o que precisa ser melhorado, o que pode ser retirado ou posto à prova, numa tentativa de melhorar o conteúdo, a forma, às vezes. Nunca é com pedantismo, quer dizer, deve existir algum editor que se acha a bola sete, mas enfim, isso existe em toda área.
Dar um não pra quem diz, desde o início, que está aberto a críticas é sempre melhor, até o momento em que ela recebe a resposta e descobrimos que ela não estava aberta coisa nenhuma para receber uma negativa. É assim, pode ser qualquer editor, dar “não” não é tarefa fácil. Se bem que já ouvi dizer que tem gente que está se especializando em negativas. Dizem até que pagam bem, que recebe no cash, ali, por cada negativa bem dada. O mercado profissional tá aí pra isso. Acho que vou fazer um desses cursos que nos ensinam a dar nãos de maneira grosseira e fina, quem sabe assim eu consiga conquistar mais inimigos ou mais locais de trabalho para engrossar a renda. E quem sabe assim eu não fique com tanta preocupação em não querer dar “nãos” aos escritores que se acham a mais pura essência da literatura.