26 de novembro de 2013

Pensar que um dia as coisas nasceram


Talvez falar sobre Noemi Jaffe seja complicado, uma vez que li apenas um livro da autora. Porém, li um alfabeto inteiro de ideias e imagens que me fez perceber que o brincar com as palavras ainda é digno de nota em todo bom escritor que quer inventar novas possibilidades de existência. E é isso que acontece em A verdadeira história do alfabeto e alguns verbetes de um dicionário.
Voltar à origem das coisas, imaginar como determinado objeto surgiu, sempre foi algo que me deixou impressionado. Às vezes, ponho-me a buscar respostar para a criação de objetos variados, seja a invenção da borracha ou do lápis à criação de um navio, por exemplo. Nesses imaginares, perdia-me, e ainda me perco, criando inúmeras possibilidades em como tudo, em certo momento, teve seu ponto originário. E se me recordo bem, já havia me perguntado de que maneira as letras do alfabeto teriam surgido. Ainda bem que Noemi Jaffe tem as respostas.
As 26 letras do alfabeto contêm sua invenção em 26 textos (contos?) escritos por Noemi. As possibilidades são as mais variadas possíveis, passando por cientistas e músicos, a invenção das letras pode ter sido gerado até mesmo por questões amorosas.
A escritora, porém concebe a partida do livro iniciando pela letra A, quando Epicuro desejava constatar o desejo dos átomos de uns pelos outros, encaminhando-se até a letra Z, a qual um cientista compreendeu que ela melhor representaria que “vários outros prótons, elétrons e até alguns nêutrons vinham recusando-se a seguir o caminho adequado desde que surgiu o tempo”.
Assim, acredito que apesar de tantas outras estórias que surgem no caminhar pelo alfabeto a “inventora das origens” nos quer dizer algo, como se a presença dos átomos em nossas vidas, em nossa criação, e de tudo que está ao nosso redor pudesse ser reflexo do que realmente acontece no mundo. Talvez essa interpretação seja um pouco exagerada, mas sabemos que os átomos estão presentes em tudo.
O importante é que Noemi consegue fazer o leitor se prender ao mundo criado entorno da palavra que começa a ganhar significado, quase sempre, por alguma motivação, simples ou complexa. Indo dos átomos ao momento quando o homem da era da pedra se põe a divagar sobre os significados, a escritora atua de maneira pontual e consegue dar respostas à pergunta que sempre fiz a mim mesmo: De onde surgiu tal palavra? Porém, ela vai além e nos diz de onde surgiram cada letra do alfabeto.
Fora o alfabeto, o livro ainda traz alguns verbetes que são praticamente desconhecidos por nós, leitores, e cria novos significados. A palavra Palanca, por exemplo, quer dizer cidade, pai, bigode. Mas também pode ser o nome de uma cidade que foi invadida, em abril de 1944, pelos nozólios (o que são nozólios?). Também temos a palavra Jaja, que quer dizer jiboia, jogo, deserto. Nota-se que os significados dado às palavras, muitas vezes, não estão relacionados e meio que estão em aberto, como se a criadora dos significados deixasse em aberto para que nós comecemos a criar os significados para as palavras desconhecidos ou até mesmo para as que conhecemos, empregando-as de formas diferentes.
Criar é o que os artistas fazem de melhor, dar novos significados, novas chances de existência é o que move, muitas vezes, pessoas como Noemi Jaffe, que inquietas tentam dar “esperanças” a quem lê, no sentido em que a leitura pode ser sim uma salvação. A verdadeira história do alfabeto e alguns verbetes de um dicionário é mais do que um alfabeto ou do que uma coleção de verbetes, é uma verdadeira máquina de criar fantasias. E o leitor que ainda prefere a realidade crua de determinados autores, que muitas vezes perdem-se no sensacionalismo acabam esquecendo que, às vezes, é melhor se deixar levar pelo espírito da Literatura.