20 de abril de 2016

A poesia de Lisa Alves

Lisa Alves

nasceu em 1981, é mineira (Araxá/MG) e radicada em Brasília. É curadora da revista Mallarmargens. No Distrito federal colabora com um fanzine feminista De Salto Alto. Tem textos publicados em diversas revistas e páginas literárias como a Revista Incomunidade (Portugal), Zunai, Flaubert, Parênteses, Germina Literatura, Cronópios e Diversos Afins. Tem poemas publicados em sete antologias lançadas no Brasil, Argentina e País Basco. Lançou em Agosto de 2015 seu primeiro livro de poesia “Arame Farpado”  (pelo selo Coletivo Púcaro e Lug Editora).

 

Site | lisaallves.wix.com/lisaalves

Blog | lisaallves.blogspot.com.br

 

[recado de um náufrago]

Antes que seja tarde,
alargue a porta e navegue o mundo! – gritou o avô.
Antes que seus dentes desmoronem,
prove todas as classes de maçãs.
Pois amanhã a seca invadirá o quintal,
a guerra destruirá as pontes e quando
se der conta se verá limitada às rações e viagens à padaria.

 

[estéril coletivo]

Ignorar o cheiro dessa maresia – ser tão antidionisíaco.
Fechar o corpo ao calor dos trópicos.
Cegar-se, perfurar a íris com versículos e leis.
Atravessar o instinto, enjaular-se,
calar o bálsamo terra-e-água.
Abrigar-se por signos: crucifixos e ideais.
Eis aqui um Eunuco.

 

[a rosa vermelha]

A Rosa Vermelha brota à margem do ruído proletário,
aguarda o húmus do tempo e o extermínio do verbo hipnótico,
execra foices, suásticas e progressos a qualquer cotação,
venera a dança sutil daqueles que meditam em movimento,
não embolsa votos, preces ou dízimo de domingo,
não dita cartilhas, manuais ou citações de conserva,
está nas veias, nas raízes, no escudo espinhoso,
é sem Estado, Pátria ou Partido.

A Rosa Vermelha não brota em vasos
industriais – adora canteiros, florestas,
água pura, solo fértil, liberdade e rituais da chuva.

Rosa Vermelha é o Mito
de toda Primavera.

                                                                      

[elementar]

Há três estações atrás topei
com uma cigana na Moldávia
e ela me jurou que os magnos
poemas são similares a uma
Puta ansiando o Príncipe Encantado.
Perguntei como uma Puta saberia
identificar essa Utopia
e a Cigana retrucou indócil:
“Exercício do método, minha criança!”